A
cada eleição o tema das pesquisas eleitorais retorna, seja como verdade
absoluta, seja por dúvidas quanto a sua veracidade. Certa vez respondi a um
incauto sem formação científica, que me havia dito que “não acreditava” em
pesquisas eleitorais mesmo contratando-as, que levantamentos desta natureza não
devem ser objeto de cunho religioso ou de credulidade, mas estavam baseadas em
instrumentos de mensuração consagrados. O incauto deve ter ficado um pouco
ofendido, o que realmente não me
importava, principalmente porque complementei que, quando o resultado lhe havia
sido favorável, não me recordava das reclamações. A maioria do público tem uma
certa esquizofrenia com pesquisas quase que pelos mesmos motivos – se o
resultado agrada, verdade; se desagrada, combate-se.
Mas,
dito isso, daqui não se segue que pesquisas não possam ser amplamente
discutidas, seja por sua metodologia, seja pelos seus limites. A pergunta sobre
como 2500 pessoas podem mensurar todo o país somente pode ser feita pela
ausência de formação científica ou incompreensão sobre as técnicas, nunca por
quem alguma vez foi informado sobre teoria da amostragem, lei dos grandes
números e assemelhados. Isso até pode ser questionado pelo senso comum, nunca
por aqueles que acolhem a formação científica. As metodologias e técnicas nas
pesquisas variam em modalidades e tipos de amostragem, técnicas de
questionário, margens de erro e níveis de confiabilidade, mas também variam de
acordo com outros aspectos: treinamento de equipe de campo, controle de campo e
entrevistas de devolução e, não menos importante, quais e como são realizadas
as questões ao eleitor.
Ao
contrário de boa parte dos economistas e de parte dos estatísticos, não é o
caso de converter esse saber científico em erudição inalcançável e modelo de verdade, pois não se trata nem de um ou outro. Trata-se da boa e velha
ciência aplicada em ação. E trata-se do uso da pesquisa como instrumento de
campanha e marketing. De início quero dizer que defendo a mais ampla e
irrestrita divulgação de pesquisas e considero um desserviço as regras de
“registro” de pesquisas em tribunais. Supostamente, como na maioria dos casos
nas eleições brasileiras, a disputa é enorme sobre regras e a judicialização
eleitoral é uma norma. Tudo termina nos iluminados tribunais que decidem como a
as disputas se desenvolvem. E, que ninguém diga que essas decisões não afetam
campanhas. Mas, por exemplo, pouco se fala sobre como as pesquisas são realizadas
ou divulgadas. Pergunto, e é legítimo perguntar: o Datafolha fez uma pesquisa
quase simultânea ao velório de Eduardo Campos. Pode? Pode pelas regras, pois
estava registrado o campo. Era desejável esperar um pouco? Era! O IBOPE foi
mais cuidadoso – em relação ao Datafolha a maioria é sempre mais cuidadosa – e outros institutos também aguardaram um pouco, caso da pesquisa
MDA-CNT.
Os
profissionais da área de pesquisa sabem que pairam sobre dúvidas sobre seu trabalho. Algumas
de boa fé, por falta de cultura científica. Outras porque as pessoas desconfiam
“porque nunca foram e nem conhecem ninguém” que tenha sido entrevistado, o que
trata-se de uma variação do primeiro argumento. Há também aqueles que crêem que
as pesquisas implicam em manipulação, o que pode incluir alguma cultura
científica ou não. Mas, entre os políticos é quase unânime que pesquisa
eleitoral é instrumento de campanha, deve ser divulgada se interessar e
escondida se ruim. Devem ser selecionados trechos favoráveis e divulgados,
devem ser ocultos os tópicos com problemas . Quem define isso, em campanhas
minúsculas, é o próprio candidato; quem define isso em campanha majoritárias é
o responsável pelo marketing eleitoral. Ainda que ali falte cultura científica
quase como regra, não falta astúcia para reconhecer que pesquisas recortam o
real com eficácia. Em suma: elas funcionam, essas senhoras e senhores sabem
muito bem disso e o momento de divulgação - e como divulgar - é um ponto nevrálgico nas estratégias
de campanha.
As
campanhas que contratam, ou os órgãos de imprensa interessados, divulgam o
real? Algumas vezes sim. Seja pela credibilidade do
instituto seja porque, quanto mais perto da eleição, há um marcador que não
mente: o resultado. Mas é sempre assim? Quem pode dizer? Há falácias
sobre margem de erro, perguntas dirigidas que podem afetar resultado e sobrevalorização
de algumas respostas Eu creio fielmente que os institutos entregam resultados
metodologicamente aceitáveis, e creio fielmente que os meios de divulgação
enfatizam coisas ao seu interesse e sem compromisso com a informação precisa.
Seguem algumas observações como kit anti-manipulação:
1 –
pesquisas não representam a eleição, são retratos instantâneos;
2 –
nunca acredite em uma pesquisa como um resultado definitivo – observe sempre a
curva de resultados no tempo. Séries são mais confiáveis, casos isolados podem
ser só isso mesmo;
3 – observem
margens de erro como possibilidades, mas nunca confie em narrações de
telejornais sobre pesquisa, na conversa de para mais ou menos que pode indicar
empate. É a série, e não UMA pesquisa que indica a tendência;
4 –
atenção para a rejeição: vale o mesmo argumento da série. E nao creia que
alguém com 40% de rejeição está fadado a perder. Tudo depende do contexto;
5 –
por que eles não indicam claramente a espontânea? Ela significa consolidação
maior ou menor. A estimulada, que a mídia divulga sem perdão, é resultado de um
círculo onde constam os nomes dos candidatos. Ela, muitas vezes, é um cenário
artificial. Quanto mais próximo das eleições, mais essas curvas se aproximam.
6 –
observe a data em que foi realizado o campo. Uma forma usual de manipulação é
um acontecimento intenso influenciar temporariamente índices de voto, ou
campanhas intensas de mídia para alterar percentuais com notícias negativas,
por exemplo.
7 - Observe muito de perto se é divulgada a volatilidade de voto, a possibilidade para mudar da opção atual para outra. A imprensa sonega frequentemente essa informação.
Resumindo, não é a pesquisa ou a técnica que produzem problemas. Quem os produz é aquele que utiliza-se das pesquisas mostrando ou ocultando resultados, ou a mídia que enfatiza o que bem quer.
PS:
Duas pesquisas recentes mostram estabilidade entre Dilma e Marina, com Aécio
ainda caindo. Vida que segue. Dilma permanece forte, Marina ainda cresce, mas o acelerador pode ter emperrado e Aécio com pouca reação. Na espontânea, a vantagem de Dilma é grande, com rejeição perto de 35%. Mas Marina permanece no páreo, cada vez mais. Faltam, por outro lado, 30 dias.
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